Você sabe dizer quando essa foto foi tirada?

  • Rafael Barifouse
  • Da BBC Brasil em São Paulo
Prisioneiros são libertados do campo de concentração de Wöbbelin, em abril de 1945
Legenda da foto, Prisioneiros são libertados do campo de concentração de Wöbbelin, em abril de 1945 (Foto original: Arquivo Nacional dos EUA)

A ciência diz que cores são capazes de despertar emoções - talvez isso esteja por trás do impacto do trabalho da mineira Marina Amaral, que se especializou em colorir digitalmente fotos em preto e branco.

Na tela do computador em sua casa em Belo Horizonte, a artista de 21 anos dá nova vida ao passado devolvendo cores - em tons impressionantemente realistas - a registros históricos por meio do programa Photoshop.

Conforme os tons de cinza dão lugar a azuis, vermelhos, verdes ou marrons, o sofrimento de um prisioneiro de campo de concentração alemão parece tornar-se mais intenso. E a destruição causada na cidade japonesa de Hiroshima pela bomba atômica fica ainda mais impactante.

"Acho que as fotos em preto e branco acabam distanciando as pessoas. O evento registrado parece quase irreal. Cores quebram essa barreira e nos aproximam dessa realidade", diz Marina, que começou a colorir fotos casualmente e, desde o início do ano, fez disso sua profissão.

Momentos que ficam na memória

Marthin Luther King Jr. marcha pelos direitos civis de negros em Washington, nos EUA

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Marthin Luther King Jr. marcha por direitos civis para negros em Washington, nos EUA
Marthin Luther King Jr. marcha pelos direitos civis de negros em Washington
Legenda da foto, Antes de colorir fotos históricas, Marina Amaral diz fazer uma extensa pesquisa de documentos e referências
Desempregados se reúnem nas ruas de San Francisco, nos EUA

Crédito, Biblioteca do Congresso dos EUA

Legenda da foto, Desempregados se reúnem nas ruas de San Francisco, nos EUA
Desempregados se reúnem nas ruas de São Francisco, nos EUA
Legenda da foto, Artista acredita que devolver as cores de imagens em preto e branco nos aproxima da situação e das pessoas retratadas

Marina aprendeu a mexer no Photoshop por conta própria quando era criança e uniu essa habilidade ao seu fascínio por história depois de conhecer pela internet técnicas para recuperar cores em fotos antigas.

Desde abril do ano passado, ela passou a se dedicar quase exclusivamente a esse tipo de trabalho e avalia que a prática lhe permitiu sofisticar seu estilo e até mesmo desenvolver métodos próprios.

Muitas das fotos nas quais trabalha são de domínio público, obtidas em bancos de imagens de fundações e instituições governamentais, como a Biblioteca do Congresso e o Arquivo Nacional dos Estados Unidos e a Biblioteca Britânica.

Médicos americanos auxiliam soldados feridos em praia da Normandia, na França, durante a 2ª Guerra Mundial

Crédito, Exército dos EUA

Legenda da foto, Médicos americanos auxiliam soldados feridos em praia da Normandia, na França, durante a 2ª Guerra Mundial
Médicos americanos auxiliam soldados feridos em praia da Normandia, na França, durante a 2ª Guerra Mundial
Legenda da foto, Trabalho de Marina Amaral tem ganhado milhares de admiradores nas redes sociais
Retrato da enfermeira japonesa Aiko Hamaguchi feito durante a 2ª Guerra Mundial

Crédito, Biblioteca do Congresso dos EUA

Legenda da foto, Retrato da enfermeira japonesa Aiko Hamaguchi feito durante a 2ª Guerra Mundial
Retrato da enfermeira japonesa Aiko Hamaguchi feito durante a 2ª Guerra Mundial
Legenda da foto, Retratos costumam demandar menos tempo, diz a artista
Retrato do ex-presidente americano Abraham Lincoln

Crédito, Biblioteca do Congresso dos EUA

Legenda da foto, Retrato do ex-presidente americano Abraham Lincoln
Retrato do ex-presidente americano Abraham Lincoln
Legenda da foto, Muitas das fotos em que Marina trabalha são de domínio público

São registros feitos em outros países e, principalmente, do início do século passado, quando a fotografia colorida ainda engatinhava. Marina diz ser "frustrante" não poder realizar o mesmo trabalho com imagens históricas do Brasil.

"Tenho muita vontade, mas é difícil achar fotos brasileiras antigas com boa resolução. As poucas que existem não são de domínio público. Talvez seja só uma questão de ainda não ter achado a fonte adequada", diz ela.

"Escolho as fotos de acordo com a qualidade e disponibilidade das imagens, mas não só isso. Adoro trabalhar com fotografias que retratam momentos históricos e ficaram marcadas na memória das pessoas."

Seguidores

Registro de uma casa do povo saami, natural da Suécia

Crédito, NORSE FOLKEMUSEUM

Legenda da foto, Registro de uma casa do povo saami, natural da Suécia
Registro de uma casa do povo saami, natural da Suécia
Legenda da foto, Hoje, existem diversas comunidades na internet dedicadas à coloração de fotos antigas
(A esq.) Arquivo Nacional dos EUA

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Retrato do piloto C. Hopson, do serviço postal americano, feito em 1926

Colorir fotos antigas é um tipo de trabalho que vem ganhando muitos adeptos e fãs nos últimos anos. Chega a reunir, por exemplo, mais de 115 mil membros em um dos fóruns do site Reddit.

Marina começou a divulgar suas obras em fóruns assim. Depois, passou a publicá-las em seus perfis em redes sociais e começou a receber encomendas para trabalhar em álbuns de família e pedidos de museus e empresas.

A demanda cresceu tanto que Marina decidiu largar a faculdade de Relações Públicas. "Estava ficando sem tempo para os estudos", explica ela. "Colorir um retrato leva uma hora, mas imagens complexas podem levar meses para ficarem prontas."

Destruição da cidade de Hiroshima, no Japão, pela bomba atômica durante a 2ª Guerra

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Destruição da cidade de Hiroshima, no Japão, pela bomba atômica durante a 2ª Guerra
Destruição da cidade de Hiroshima, no Japão, pela bom atômica durante a 2ª Guerra
Legenda da foto, Cenas mais complexas podem demandar meses de trabalho, explica Marina Amaral
Fotos de general William T. Sherman

Crédito, Marina Amaral

Legenda da foto, Fotos de general William T. Sherman

Por meio do Twitter e do Facebook, as novas versões das fotografias feitas por Marina começaram a chamar a atenção de entusiastas desse tipo de trabalho e de historiadores. Hoje, ela tem milhares de seguidores em seus perfis nestas redes.

Foi pelo Twitter que Daniel Jones, historiador e apresentador do canal britânico Channel 5, conheceu Marina.

"Amei seu trabalho de cara, compartilhei em meu perfil algumas vezes e passamos a trocar mensagens", conta Jones, que convidou Marina para um projeto em conjunto.

Pesquisa 'rigorosa'

Região conhecida como Banana Docks, no píer de Nova York, no início do século 20

Crédito, Biblioteca do Congresso dos EUA

Legenda da foto, Região conhecida como Banana Docks, no píer de Nova York, no início do século 20
Região conhecida como Banana Docks, no pier de Nova York, no início do século 20
Legenda da foto, Esta imagem, segundo Marina, foi uma das mais trabalhosas para colorir, por conter muitos detalhes
Família em bebedouro no Central Park, em Nova York, em 1942

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Família em bebedouro no Central Park, em Nova York, em 1942
Família em bebedouro do Central Park, em Nova York, em 1942
Legenda da foto, Colorir o passado passou de hobby a profissão da artista mineira

Jones diz que as fotos de Marina "são a maneira perfeita de fazer as pessoas se interessarem por história na internet", porque "nos fazem ter empatia pelo que é retratado de uma forma que a foto em preto e branco não permite em um mundo saturado de cores como o nosso".

Para o historiador, ela se destaca entre outros artistas do gênero por "sua pesquisa rigorosa", algo também destacado com frequência por publicações de peso, como a revista americana Wired - que a chamou de "mestre da colorização" - e o jornal britânico Daily Mail, que publicaram reportagens sobre a arte de Marina.

Bandeira americana é hasteada no norte da França após a vitória sobre os alemães

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Bandeira americana é hasteada na França após vitória dos Aliados
Bandeira americana é hasteada na França após vitória dos Aliados
Legenda da foto, Maioria das imagens coloridas por Marina é do início do século 20
Meninos franceses diante de tanque alemão após derrota de nazistas na França

Crédito, Impedrial War Museums

Legenda da foto, Meninos franceses diante de tanque alemão após derrota de nazistas na França
Meninos franceses diante de tanque alemão após derrota de nazistas na França
Legenda da foto, Ao escolher fotos, Marina busca imagens com qualidade e que retratam momentos marcantes

Antes de colorir uma imagem, Marina busca documentos e referências que indiquem os tons originais da pessoa ou cena fotografada.

"Acho que, até o momento, trabalhos assim não levavam tão a sério a pesquisa histórica. Dedico muitas horas a isso para o resultado ser o mais fiel possível à época", diz ela.

Jones vai além: "As ferramentas estão disponíveis para todo mundo, mas é preciso ter habilidade artística. Marina tem um talento nato."

Escola para negros em Anthoston, no Estado de Kentucky (EUA), em 1916

Crédito, Biblioteca do Congresso dos EUA

Legenda da foto, Escola para negros em Anthoston, no Estado de Kentucky (EUA), em 1916
Escola para negros em Anthoston, no Estado de Kentucky (EUA), em 1916
Legenda da foto, Colorir imagens em preto e branco faz as pessoas se interessarem pela história, diz o inglês Daniel Jones
Retrato de Lewis Powell, que tentou matar o secretário de Estado americano William H. Seward em 1865

Crédito, Arquivo Nacional dos EUA

Legenda da foto, Retrato de Lewis Powell, que tentou matar o secretário de Estado americano William H. Seward, em 1865
Retrato de Lewis Powell, que tentou matar o secretário de Estado americano William H. Seward em 1865
Legenda da foto, Marina Amaral diz que a história sempre a fascinou