Joanna Maranhão
desabafou, chorou, mas se manteve firme. Após sua última participação na Olimpíada
do Rio de Janeiro, a nadadora externou toda a sua angústia. Um dia depois de
ver críticas pesadas nas redes sociais, a pernambucana aproveitou a passagem
pela zona mista do Estádio Olímpico de Esportes Aquáticos e falou tudo o que estava engasgado. Citou companheiros de natação, lembrou do que a judoca Rafaela
Silva passou em Londres, falou do futuro e, na defesa dos atletas brasileiros,
pediu respeito.
- Eu queria falar em
nome de todo mundo. Eu lembro quando a Rafaela pegou na perna, há quatro anos,
em Londres, e a galera esculachou com ela. Macaca, não sei o quê...Quatro anos
agora e a Rafaela se torna heroína. Mas a Rafaela já era heroína. Desde o
momento em que ela pegou a oportunidade de fazer judô. Do jeito dela, daquele
jeito que ela diz que é. Eu não subi no bloco para piorar meu tempo. Kitadai não
entrou no tatame para perder medalha, a Sarah não subiu no tatame para não
ganhar medalha, a Erika não medalhou o ciclo olímpico inteiro e foi tão
constante para não ganhar medalha, o Luciano não treinou todos esses anos para perder
a vaga no final, o Cielo não escolheu ficar de fora dos Jogos Olímpicos, o
4x100m livre do Brasil não ficou em quinto porque fez corpo mole. A gente dá
duro todo dia. Vocês sabem disso, mas o Brasil é um país machista, um país
racista, um país homofóbico, um país xenofóbico. Não estou generalizando, mas
essas pessoas existem, infelizmente. E aí, quando elas estão atrás de um
computador, elas se acham no direito de fazer essas coisas. Todo mundo tem
direito de discordar de meus posicionamentos políticos que são da minoria. Eu
não faço parte da maioria. Mas a minha formação, a minha história, fez com que
sentisse uma necessidade de me posicionar politicamente. E eu não vou parar. O
que eu puder fazer para melhorar meu país de alguma forma, eu vou fazer –
desabafou a nadadora com os olhos marejados.
Na manhã desta terça-feira,
a atleta afirmou, em suas redes sociais, que vai processar autores de ofensas
feitas contra ela nas redes sociais. No último sábado, depois de fazer sua
estreia na Rio 2016, Joanna escreveu uma mensagem de agradecimento à torcida em
sua página no Facebook. Entre os comentários, muitos foram ofensivos à atleta,
que tem como costume manifestar na internet opiniões ligadas a política, além
de ter um conhecido trabalho de apoio a crianças vítimas de abuso sexual.
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Durante pouco mais
de dez minutos, a nadadora rebateu os agressores. Não foram poucas as vezes em
que teve que parar de falar para enxugar as lágrimas e se recompor. Disse ter
ficado espantada com os comentários que viu e que, por isso, teve dificuldade para
dormir. Entretanto, descartou qualquer influência do episódio em seu rendimento
nos 200m borboleta, quando fez 2m10s69, ficou na 24ª colocação e não conseguiu
vaga para a semifinal.
- Não acho que
tenha refletido na prova. Eu nadei mal e ponto final. A culpa é minha. Eu
travei no final. A culpa é 100% minha. Não estou usando isso para justificar,
de jeito nenhum. Mas desejar que eu seja estuprada, desejar que minha mãe
morra, comemorar porque eu não peguei uma final por cinco centésimos, eu acho
isso uma covardia, uma falta de caráter. Isso não se faz com ninguém. Todo
mundo já passou por alguma decepção na vida. Eu já ganhei por cinco centésimos,
já perdi por cinco centésimos. Eu já pensei em tirar minha própria vida. Eu
lutei pra caramba (choro). Eu conquistei quatro vezes o índice olímpico para
estar aqui. Eu sou a melhor atleta do medley do Brasil desde os 14 anos de
idade. Eu não preciso que isso tenha valor para os outros. Eu preciso que tenha
valor para mim. Pra mim tem valor. Eu me orgulho muito da minha trajetória, da
minha história. Não é que esse tipo de mensagem vai me fazer parar de nadar ou
desistir. Mas machuca, dói. A Rafaela não merecia ter escutado o que ela
escutou há quatro anos. A Sarah não merece escutar. Eu lembro que o Leandro
Guilheiro teve um ciclo até Londres brilhante. E aí, quando ele não ganhou
medalha as pessoas começaram a chamar ele de Leandro Pipoqueiro. Um cara que é
campeão mundial júnior, tem duas medalhas em campeonatos mundiais, duas
medalhas em Jogos Olímpicos, um cara que tira golpe dos dois lados, ser chamado
assim, é muito cruel. Eu não sei se o fato de a gente vir de um país com uma cultura
futebolística faz com que as pessoas se sintam no direito de fazer isso –
acrescentou.
Confira abaixo outros temas abordados por Joanna Maranhão durante a entrevista
acusações
- A gente precisa
ter um pouco mais de respeito, um pouco mais de simpatia pelo ser humano. A
gente não tem o direito de tratar as pessoas assim. Desejar que eu seja estuprada?
Sério? Porque eu não apoio o político x ou y? Falar que eu inventei a história
da minha infância para estar na mídia? Isso é muito pesado. Pelo amor de Deus. Como
que alguém pode imaginar que eu seria capaz de inventar um abuso para estar na
mídia? Que tipo de mídia é essa que eu quero estar? A minha mãe até hoje tem
que sentar de frente com o cara que fez o que fez comigo para escutar ele dizer
que não fez. Será que eu ia querer que a minha mãe passasse por isso? Que tipo
de ser humano monstro seria eu? É pesado, é muito louco. Estou fazendo um apelo
para as pessoas. Ninguém tem a obrigação de gostar de mim, mas respeita. Eu
aguento porque eu não tenho outra opção na minha vida. Mas não é todo mundo que
aguenta.
manifestações políticas na rio 2016
- As pessoas não foram para pedir
o impeachment? É um direito delas. Se as pessoas querem usar isso aqui para uma
conotação política, deixa gente. Portanto que não passe para a violência,
deixe. Em nossa bagunça brasileira a gente se organiza. Acho que a gente já está
se organizando. A gente já entendeu que as coisas não estão boas e precisam
mudar. Mas, por favor, gente, não fiquem desejando que eu seja estuprada. Por
favor, não façam mais isso.
autocontrole
- Estou sempre
aprendendo. Por incrível que pareça, eu falo menos do que eu falava antes.
Muito por indicação do meu técnico. Mas, às vezes, não dá. Estou tentando aprender.
maratonas aquáticas
- Não consigo
tirar a natação da minha vida. Os Jogos Olímpicos acabaram, mas eu tenho o
Finkel. Tenho contrato com o meu clube, tenho que ser profissional com meu
clube. Eu até falo pro meu técnico: “O ano de 2016 está passando muito rápido”.
Eu não quero que acabe. Quem sabe fazer uma meia temporada de maratona. Não sei
se vou conseguir levar porrada no mar e não dar. Acho que eu vou levar uns
cartões vermelhos nas primeiras vezes por ser sangue quente. Ainda quero viver
alguma coisa na natação. Algumas etapas de maratonas aquáticas dentro do Brasil
é uma coisa que me apetece. Não sei. Vai que depois que eu case, eu não quero?
Mas não quero que a natação acabe não. Acho que ainda sou boa nesse negócio.
casamento
- Casamento está
marcado para o dia 15 de outubro. O combinado com Lu foi o seguinte: “Lu, você
vai ter que trabalhar para botar dinheiro em casa porque eu quero passar em um
concurso público e dar aula para criança em escola público. E isso não dá muito
dinheiro”. Eu preciso me sentir útil. Nadando eu me sinto útil. Eu preciso fazer
alguma coisa na vida que eu sinta que estou fazendo a diferença. Aula do que
for, alguma aula que eu tenha condições d estar em contato com quem está em
formação. Me sinto a necessidade de ser útil. Preciso fazer alguma coisa para melhorar
o país de alguma forma.